2011-02-27

Irlanda: será Portugal "a proxima vítima"?

Na Irlanda o Fianna Fáil (o partido do centro, à esquerda do Fine Gael e à direita do Labour) teve o seu pior resultado desde… 1921 e cede o poder ao Fine Gael (Centro-direita), em provável coligação… com  Labour! Mas, importante, não parece ter tido votação suficiente para uma maioria parlamentar (pelo que a estabilidade não estaria assegurada, caso ocorresse semelhante entre nós).
De relembrar que a situação Irlandesa é diversa mas também similar à Portuguesa em alguns aspectos
  • a última década de Portugal foi de estagnação, a Irlandesa de um fortíssimo crescimento (chegou a ser de 6 a 8% anos consecutivos), tirando a Irlanda, que aderiu à CEE (UE) em 1973, da cauda da União Europeia a 15 para o segundo país com maior PIB per capita, só atrás do Luxemburgo!
  • Ao contrário de Portugal, onde a nota foi a estabilidade ou a lenta subida, a Irlanda sofreu uma forte valorização imobiliária com os preços a subirem praticamente 100% na última década, até à crise financeira! Essa especulação explica parcialmente o porquê do colapso do sistema financeiro Irlandês (os “activos tóxicos”)
  • Já quanto a uma das explicações da crise Irlandesa, algo similar à Portuguesa, prende-se com um dos motores do crescimento: baseado em investimento estrangeiro, no caso Irlandês muitas vezes decidido pela diáspora, sobretudo por gestores de multinacionais norte-americanas, faz com que haja alguma crise económica quando esse investimento cessa, ou se retira, levando a uma falta de liquidez dramática num sistema de financeiro que, no caso Irlandês se havia “dopado” com esse afluxo de capitais pouco sustentável no longo prazo
  • As razões para o crescimento rápido são também parte das causas profundas do colapso financeiro Irlandês: além das razões culturais e emocionais, as razões mais fortes para o investimento estrangeiro eram a mão de obra qualificada (a aposta da Irlanda nos anos 70 e 80 para os fundos Europeus foi a formação… ), a língua inglesa e uma política fiscal altamente atractiva para o investimento… Ora isso implica que se o investimento parasse de aumentar, as receitas fiscais iriam cair dramaticamente, tornando deficitário um Estado que teve anos consecutivos de superavits… (algo diferente do Português…)
Em resumo: a crise Irlandesa é de natureza financeira, e tem forte potencial de recuperação económica, a médio prazo. A Portuguesa é económica, de base: crescimento nulo, ou pouco mais, na última década, e poucas expectativas de crescimento na próxima década. Ou seja: a crise Portuguesa tem mais relação com os “fundamentais”…

Por razões e com percursos diferentes, a verdade é que ambos os países tiveram, a partir de 2008, um problema grave de insolvabilidade… A Irlanda teve de recorrer à ajuda externa antes de Portugal, mesmo após ter cortado salários da função pública na casa dos 20%. O Estado foi forçado, em 2008, a ir em socorro da banca e em Novembro, teve de recorrer ao fundo de resgate da União Europeia e do Fundo Monetário Internacional (FMI)- uma ajuda a 5% de juros anuais. Para muitos, esta perda de soberania financeira e as duras medidas de austeridade impostas ao país explicam os resultados eleitorais históricos.
A questão é então saber se em Portugal estaremos perante cenário idêntico – necessidade de ajuda externa – e se tal é positivo ou negativo, ou se é solução –, e se estamos também nós perante uma crise e uma mudança política. Com juros acima de 7%, e perante um crescimento nulo ou negativo, as perspectivas para Portugal para a próxima década são mais do que negras, apesar do louvável esforço na área das exportações e de indústrias inovadoras. Sócrates vai reunir-se com Merkel, a convite desta, antes da cimeira decisiva… E a instabilidade política é negativa, não ajuda nem irá ajudar, mas a verdade é que se as sondagens aguçam o apetite do PSD e as pressões internas sobre Passos Coelho aumentam. Este, porém, mantém-se calmo, não mostrando pressa de chegar a um poder que sabe que será duro, muito duro. E sabe também que é difícil ter sucesso sem o apoio de certas figuras, incluindo do mais influente Português da actualidade – Ricardo Espírito Santo, que claramente entende que eleições agora seriam negativas para o país.
PS: falamos da República da Irlanda “do Sul”, a independente, “a católica”, por contraste com a “do norte”, parte do Reino Unido e protestante na sua maioria)
PS: entretanto, dois artigos importantes para melhor compreender as nossas relações com o Magreb e as implicações da crise nesta região sobre o mercado petrolífero, de que representa ao todo mais de 35% do mercado mundial, e que explicam a atenção do mundo sobre os acontecimentos recentes na Líbia e nos demais países.
PS: E curiosos os links sugeridos por Pedro Magalhães no seu margens de erro, incluindo o link para a tese de Doutoramento na London School of Economics por Saif Al-Islam Alqadhafi, filho de Khadafi sobre… "The Role of Civil Society in the Democratisation of Global Governance Institutions: From ‘Soft Power’ to Collective Decision-Making?"!! E por falar em sociedade civil: interessante artigo sobre o futuro político de Fernando Nobre e da nossa cidadania…

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